O Síndico do edifício onde moro deu a seguinte informação ao final da reunião da Assembléia Geral: “já que a maioria não concordou com a instituição da taxa extra, vamos deixar de fazer as melhorias pretendidas por parte dos moradores”. Quem ganhou? Quem perdeu? Houve ganhadores e perdedores? A maioria assim decidiu.
Assim é no nosso condomínio, assim é para uma comunidade qualquer, assim é para o país. Algumas coisas, necessariamente, deixarão de ser feitas. Estabeleçamos prioridades: se o nível de investimento na economia é tradicionalmente baixo, não podemos reduzi-lo, sob pena de travarmos o crescimento econômico; como é socialmente desejável que todos os brasileiros tenham o mínimo de suas necessidades satisfeitas, não se pode nem pensar em cortes no bolsa-família; as transferências obrigatórias, o próprio nome já indica, têm que ser cumpridas. Restam as transferências voluntárias e a “queima de gorduras” nas despesas de custeio.
É preciso desmistificar o propalado excesso de receita do governo. Uma família pode viver com uma renda de R$ 1000,00; essa família viverá melhor se a sua renda aumentar para R$ 5.000. O que vai diferir é o nível de vida, é o padrão de bem estar dos seus membros. Analogamente, mais dinheiro arrecadado significa a possibilidade de melhorar o padrão de vida de milhões de brasileiros que precisam do Estado.
Não se pode participar do jogo de sedução de opositores que afirmam que o governo gasta demais. Mesmo porque quando um orçamento é aprovado pelo Congresso Nacional, a despesa é igual à receita. Esta é uma condição, imposta por uma lei (nr. 6420) que vigora desde 1964. Como a despesa, segundo a lei, se constitui numa autorização, fica o governo autorizado, de antemão, a gastar aquilo que for arrecadado. Quando há excesso de arrecadação, ele precisa de nova autorização legislativa para realizar os gastos.
No entanto, durante a execução orçamentária, no exercício financeiro, que vai do primeiro ao último dia de cada ano civil, é feito um esforço para que a receita supere a despesa propiciando as condições para se saldar os juros e parte da dívida interna – esse é o tal superávit primário.
Sem os recursos da CPMF, fica sacrificada a geração do superávit primário, ficam sacrificados os serviços que o Estado propicia nas áreas de saúde e de educação.
Os reflexos para a economia não podem ser vistos apenas dessa forma. Existe um mercado financeiro que é bastante sensível a essas mudanças. Refletirá na bolsa de valores, com uma possível queda no seu desempenho e o fluxo de capitais externos só será aliviado porque nos Estados Unidos a taxa de juros foi reduzida em mais 0,25%.
São várias as funções da CPMF, ressaltando-se o fato de ser inibidora da sonegação. Isto pode se constituir em fator de preocupação para muitos.
Parece, e é, uma contradição o fato do Poder Legislativo ter aprovado a regulamentação da Emenda 29, que destina mais R$ 24 bilhões para a saúde e, ao mesmo tempo, retira o dinheiro para o mesmo setor.
É preciso ter cuidado, também, com uma informação que ouvi hoje de um comentarista da CBN, segundo o qual é melhor o dinheiro nas mãos das pessoas, na sociedade, do que entregá-lo ao governo. E mais ainda: o dinheiro que cada um pagaria por conta da CPMF poderia ser empregado no pagamento de um bom plano de saúde! No ponto máximo desta ilação, governo não arrecadaria recursos; governo sem recursos não existiria razão da sua existência, o que seria um regime anárquico. Por outro lado o governo não exerceria a sua função distributiva, pois os mais abastados teriam direito aos serviços de saúde pagos por aquilo que ele contribuiria para oferecer tais serviços aos mais pobres.
Assim, os pobres deixam de ganhar. E, em economia, deixar de ganhar significa perder.
Newton Braga,
Professor de economia do Instituto de Educação Superior de Brasília (IESB)
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